quinta-feira, 29 de novembro de 2012

CRESAP: algumas notas

Uma das coisas boas que a troika exigiu ao governo português foi uma maior separação entre o poder político e a Administração Pública, especialmente no que toca a promiscuidade na atribuição de cargos de dirigente superior ou gestor público. É uma batalha que muitos dirão que está perdida, mas no dia 25 de setembro de 2012 deu-se um primeiro passo para uma maior meritocracia na Administração Pública, tendo sido a primeira vez que se abriu procedimento concursal público para preenchimento dos cargos de direção superior.


Apesar destes procedimentos concursais serem feitos por uma entidade independente, a Comissão para o Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CRESAP), existem ainda algumas "nuances" que permitem uma certa desconfiança no sistema por parte dos mais céticos, como:
  1. N.º 2 do artigo 18º da Lei n.º 64/2011 - cabe ao membro do Governo, com bastante discricionariedade, definir o perfil, experiência e competência da pessoa a ocupar o cargo;
  2. N.º 6 do artigo 19º da Lei n.º 64/2011 - o júri elabora uma proposta de designação indicando 3 candidatos, cabendo ao membro do Governo a decisão entre um dos três, podendo inclusivamente realizar ainda uma entrevista de avaliação aos candidatos;
  3. Ao contrário do que acontece nos cargos de direção intermédia, o dirigente superior não precisa de ter tido um vínculo público entre 4 a 6 anos como técnico superior na Administração Pública, o que alarga o espectro de candidatos  a pessoas menos qualificadas e altamente politizados para esses cargos, onde a exigência de acesso deveria ser, pela lógica, ainda maior do que ao cargo de dirigente intermédio.
Estas 3 "nuances" são uma "machadada" na transparência e meritocracia que se deseja numa Administração Pública, mas o facto de existir um procedimento concursal para os cargos de direção superior permite a colocação de uma sementinha que vá crescendo e desenvolvento até se tornar numa bela flor! Mas se calhar sou demasiado otimista....

2 comentários:

  1. Gostei da tua análise João, apenas discordo da última parte sobre a sementinha... não acredito que nada de melhor vá nascer daí, nem a curto, nem a médio prazo. Simplesmente como tão bem informaste, fizeram um belo texto, floriado e com pequenas particularidades que mantêm o Governo como orgão de definição de quem é e quem não é contratado.

    E no "cabendo ao membro do Governo a decisão entre um dos três" mantem-se a Oligarquia atual.

    Nada mudou a meu ver.

    O que é ter "com bastante discricionariedade"? Isto é ridículo, é permitir uma não clareza do artigo, tornando a sua interpretação e aplicação abstrata!

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    1. Obrigado Pedro! Tenho que esclarecer que as alíneas colocadas no texto não são transcritas, portanto a discricionariedade vem da minha parte... significando que os critérios definidos pelo membro do Governo podem ser altamente subjetivos e díspares, quando na minha opinião deveriam estar definidos à partida com base num modelo de gestão por competências estabelecidos para os cargos de direção.

      O meu devaneio de esperança tem a seguinte linha de raciocínio:
      1- Este sistema, apesar de encapotado, é melhor do que existia anteriormente, ou seja, sem concurso e com uma nomeação direta;
      2- Quando se abre uma brecha de liberdade ou de igualdade em democracia, mais cedo ou mais tarde, as tais paredes oligárquicas ou totalitárias irão ruir... é uma questão de tempo.

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